Fiz ontem a minha primeira apresentação aberta sobre linguagem clara.
Tenho conversado sobre o tema em ambientes corporativos e aguardava o momento de falar para um público mais amplo.
Por uma gentileza do destino, calhou de ser na Puc-Rio. No fim desse texto, explico melhor esse destino gentil.
A palestra “Mais clareza, por favor” ocorreu no auditório do Departamento de Comunicação. Cerca de 25 pessoas assistiram, entre alunos e professores. A palestra foi gravada e ficará no acervo da universidade.
O público mostrou interesse em conhecer a temática e acompanhou com atenção a apresentação de 40 minutos. Houve interações interessantes ao final, como a de Marcylene Capper, professora de Ética Profissional, disciplina obrigatória para todos os alunos da Puc.
A professora não conhecia a linguagem clara e percebeu a importância de discutir o tema em suas turmas, tão relacionado a uma postura profissionalmente ética.
Já Thais Miranda, tradutora jurídica ligada à Puc, contou ter descoberto recentemente a linguagem clara e estar em busca de referências no Brasil. Viu o cartaz da palestra “Mais clareza, por favor” em um mural da universidade e veio assistir.
Thais inspirou-se com o trabalho da especialista em linguagem clara britânica Joanna Richardson– que mora em Buenos Aires e é consultora de um grande escritório de advocacia – e quer aplicar linguagem clara no seu trabalho de tradução.
Não pude conter um sorriso. Por uma enorme coincidência, Joanna é o meu principal contato na associação internacional PLAIN.
Terminada a palestra, uma entrevista para TV Puc. Primeira pergunta da aluna-repórter: “Heloisa, qual a importância de uma disciplina sobre linguagem clara ser oferecida aos alunos de Comunicação?”
Fiz uma anotação mental: contactar o diretor do departamento.
Também conversei com a Rádio Puc. Outra aluna-repórter, outra pergunta sagaz: “Que lugar a linguagem clara pode ocupar na escrita acadêmica?”. Praticamente ouvi o robô de Will Robinson na série “Perdidos no espaço” alertando para o perigo. Este é um tema delicado.
Respondi mais ou menos assim. Se considerarmos o conceito de comunidade científica como um grupo de pares que tratam de assuntos semelhantes, ou seja, todos de um mesmo círculo que dominam determinado tópico e trocam seus achados e questionamentos, então tudo bem usar jargão, termos técnicos e abstrações. Emissores e receptores falam a mesma língua e se entendem.
Complementei dizendo que, quando o interesse da academia for dialogar com a sociedade, prestar contas dos investimentos públicos na construção da ciência e comunicar os achados de pesquisa, então é hora de buscar a linguagem clara. Citei o caso da Cochrane e seus resumos executivos de artigos médicos em linguagem clara.
No início deste texto, qualifiquei a palestra na Puc-Rio como “gentileza do destino”. Explico o porquê.
Quando me fez o convite, a professora e publicitária Claudia Brutt não sabia da ligação que tenho com a universidade. Ela esteve em um encontro onde meu pai, também publicitário, mencionou linguagem clara. Claudia então pegou os contatos da “filha do Elysio” e me procurou.
Atualmente, tenho dois pés na Puc-Rio, em lugares diferentes.
Um ano atrás, coloquei um pé na especialização em Cultura do Consumo. Fui atrás do curso porque buscava um referencial teórico não-linguístico onde pudesse ancorar a “aplicabilidade” da linguagem clara.
A abordagem das Ciências Sociais foi importante para alargar o meu ponto de vista. Estou fazendo a monografia de conclusão sobre transparência governamental e linguagem. Meu foco de pesquisa é o caso do Governo Aberto SP, que publicou um guia de adoção de linguagem clara. Termino em dezembro.
Já o outro pé está no mestrado em Estudos da Linguagem. Estou fazendo a disciplina Tópicos em Psicolinguística com a professora Erica Rodrigues.
Ela se interessou pela minha pesquisa e sugeriu que eu conhecesse o programa fazendo uma matéria. A psicolinguística e a linguagem clara têm territórios em comum.
Espero que surjam outras oportunidades de propagar pela Puc a boa nova da linguagem clara. Afinal de contas, uma instituição de ensino jesuíta entende o valor da divulgação de evangelhos e da conversão em busca de uma vida melhor.
Ah, sim, meus pés e minha alma já estiveram fincados na Puc uns anos atrás. Foi quando cursei três semestres da graduação em Teologia. Precisei trancar porque era uma época de muita demanda na VivaMúsica!. Mas ficou o olhar teológico, que me acompanha por todo canto. Como já bem definiu o poeta e.e.cummings, i carry it in my heart.