O ano de 1994 merece uma entrada na cronologia da linguagem clara no Brasil.
Foi quando surgiu Madame Natasha, personagem inventada pelo jornalista e escritor Elio Gaspari para criticar a comunicação desnecessariamente complicada tão típica na fala de políticos, gestores e burocratas.
Segundo seu criador, Madame Natasha “tem horror às empulhações verbais”, “cuida dos desvairados da linguagem” e “protege a fama dos inválidos do idioma”.
Ela finge ser uma professora de piano: o que faz mesmo é traduzir o sentido das frases truncadas e conceder bolsas de estudos aos mais necessitados.
A primeira aparição foi em 4 de setembro de 1994, data em que Gaspari começou a publicar uma coluna dominical nos jornais O Estado de S.Paulo – depois transferida para a Folha de S. Paulo – e O Globo.
Já na estreia, os óculos da Madame estavam lá. Ficaram associados à personagem durante o período em que a coluna ocupou página inteira.
O primeiro beneficiário de bolsas de estudo foi o então ex-Ministro da Fazenda, Paulo Haddad, que teria escrito em um artigo:
Talvez seja razoável pensar que o novo ciclo de expansão da economia brasileira deverá ser comandado pela promoção de eixos espaciais de desenvolvimento, organizados em torno de grandes estruturas de diferentes formas de investimentos em transporte e energia, em áreas que apresentem vantagens competitivas internacionais para a exploração e o beneficiamento de recursos naturais renováveis e não renováveis
E Gaspari oferecia a tradução:
Madame Natasha acha que ele queria dizer o seguinte: O Brasil progredirá investindo em transporte e energia, em áreas ricas de recursos naturais
De 1994 até hoje, os leitores têm acompanhado a incessante atividade da guardiã do idioma. Cerca de uma vez por mês, Madame Nastasha espinafra textos mal escritos e os traduz para português claro.
Quando surgir uma premiação brasileira para os melhores e os piores da comunicação clara (a exemplo de iniciativas semelhantes na Inglaterra e Nova Zelândia), a Madame e seus óculos podem ser fonte de inspiração. Seria uma justa homenagem.