Terminei a especialização em Cultura do Consumo na PUC-Rio nos últimos dias de 2017. Entreguei a monografia e emendei com férias para refrescar os neurônios. Tirei o couro deles durante um ano e meio, foi bom dar uma pausa.
O título da pesquisa é Clareza em textos de e-gov, uma questão de cidadania – Subsídios do movimento mundial pela linguagem clara para facilitar a compreensão de textos que orientam cidadãos brasileiros em ambientes de governo eletrônico.
Clique aqui para baixar a pesquisa (pdf completo)
Monografias de especialização não precisam apresentar uma lista de palavras-chave. Se precisassem, os termos seriam: Linguagem clara, Governo eletrônico, Cidadania, Acessibilidade e Transparência.
Os objetivos da pesquisa
Meu objetivo geral com a monografia foi problematizar a compreensibilidade de textos em ambientes de governo eletrônico no Brasil e no exterior.
Construí a argumentação a partir do movimento mundial pela linguagem clara e do direito do cidadão entender informações que orientam a sua vida.
Já os objetivos específicos da pesquisa foram:
- Traçar um breve histórico do movimento mundial pela linguagem clara entre 1940 e 2010;
- Destacar marcos sociais e legais relacionados à adoção de linguagem clara pelos governos eletrônicos dos EUA e do Reino Unido;
- Listar marcos sociais, culturais e legais que convergem para a adoção de linguagem clara no país;
- Compilar leis, normas e orientações governamentais brasileiras que recomendam adoção de linguagem compreensível (de forma geral e especificamente no âmbito de governo eletrônico);
- Analisar documentos e estudos sobre textos de governo eletrônico a partir da perspectiva da linguagem clara.
Quando escrevi este post, o Departamento de Ciências Sociais da PUC-Rio ainda não tinha disponibilizado as monografias de seus cursos de especialização. Então, para acessar minha pesquisa, só mesmo aqui pelo blog.
Trajeto pouco ortodoxo levou ao e-gov
Fazer curso de Ciências Sociais para refletir sobre uso de linguagem foi um trajeto de pesquisa pouco ortodoxo.
Fui parar lá porque desconfiava que conteúdos de Antropologia, Sociologia e Psicanálise ajudariam a enquadrar um campo de investigação até então pouco claro (sem trocadilhos) para mim. Felizmente deu certo.
Os autores que estudamos – Malinowski, Simmel, Bauman, Lipovestky, Weber, Freud, J.L.Austin, Saussure, Durkheim, Colin Campbell, Lívia Barbosa, entre tantos outros – jogaram uma luz diferente sobre os livros, artigos, pesquisas e notícias de linguagem clara que também fui lendo em paralelo ao curso.
Estes autores não estão explicitamente presentes na monografia, porém passaram a embasar minha visão de mundo.
Antes de pesquisar a compreensibilidade de textos que orientam cidadãos em e-gov, eu havia formatado e já apresentado um outro projeto. Minha proposta era verificar se é possível correlacionar o superendividamento com a linguagem usada por financeiras quando o consumidor contrata crédito.
Comecei o levantamento documental, reuni bibliografia e iniciei pesquisa de campo. Mas logo percebi que seria perda de tempo investigar uma engrenagem que roda azeitada por hipocrisia.
Do Banco Mundial ao Banco Central do Brasil, passando pela Associação Brasileira de Empresas de Cartão de Crédito, todo o mercado financeiro “defende” a linguagem compreensível na contratação de crédito. Sabemos que a realidade é diferente disso.
Ou seja, meus eventuais achados de pesquisa teriam pouco ou nenhum uso no mundo real. Seriam meses de esforço intelectual à toa.
Saí da contratação de crédito e entrei no território da cidadania, que também estava no escopo do curso. Foi uma sábia decisão.
Só sinto pena de não ter lido um livro do antropólogo Arjun Appadurai que entraria na bibliografia da pesquisa sobre crédito.
É uma obra recente e já referencial sobre linguagem do mercado financeiro: Banking on Words: The Failure of Language in the Age of Derivative Finance. Um dia volto a ele.
Quando formatei a monografia sobre clareza em textos de e-gov, o professor Antonio Engelke orientou que eu me descolasse do enfoque inicial em “consumo de dados abertos”.
Seria melhor usar a pesquisa para montar um panorama da linguagem clara no Brasil e no mundo, com foco na adoção em ambientes de governo eletrônico.
Assim fiz. Estruturei a monografia Clareza em textos de e-gov, uma questão de cidadania em três capítulos:
- A linguagem clara no mundo: O movimento pela linguagem clara e o processo que levou ao seu uso em governo eletrônico nos EUA e no Reino unido;
- A linguagem clara no Brasil: Aspectos que convergem para a adoção de linguagem clara no país;
- A linguagem clara e o e-gov no Brasil (pesquisa documental e revisão de literatura)
Orientadores excepcionais e pesquisadora noviça
Por último, mas não menos importante, vale dizer que tive a coorientação da professora Erica dos Santos Rodrigues, do Departamento de Letras da PUC-Rio.
Erica é coordenadora do Programa de Pós-Graduação em Estudos da Linguagem da universidade e atua no campo da Psicolinguística. Ela é muito receptiva a pesquisas que envolvam a compreensão de textos escritos.
Foi uma chance e tanto ter sido orientanda de Antonio Engelke e coorientanda de Erica na mesma monografia. Dois professores excepcionais.
Aproveito para agradecer mais uma vez a eles pela generosidade intelectual e pela atenção destinada a esta pesquisadora noviça. E também pela nota 10 que ganhei.