Um bom lugar para exercitar a “tradução” de textos difíceis de entender é o site do INSS.
As orientações sobre pagamento de auxílio-doença são escritas em linguajar burocrático, erudito e impessoal.
É um texto que implora para ser traduzido em linguagem clara.
A frase abaixo, por exemplo, tem 42 palavras.
Nos últimos 15 dias do auxílio-doença, caso julgue que o prazo concedido para a recuperação se revelou insuficiente para retorno ao trabalho, o segurado poderá solicitar a prorrogação do benefício pela Central 135, internet ou comparecendo em uma agência do INSS.
O custo cognitivo para ler uma frase assim é desnecessariamente alto. Na versão para computador o texto ocupa três linhas e na tela do celular fica ainda maior.
Ninguém tem tempo ou paciência para ler uma frase desnecessariamente grande, prolixa e superlotada de informações.
Milhões de brasileiros sequer conseguem ler orientações escritas desse jeito, pois não têm escolaridade suficiente para dar conta.
Fiz um exercício de reescrita da frase. Quebrei-a em três. Veja como ficou:
Se você ainda estiver doente na data de voltar ao trabalho, pode pedir o auxílio-doença por mais tempo.
O pedido tem que ser feito 15 dias antes do prazo terminar.
Você deve ligar para a Central 135, preencher o formulário de prorrogação no site ou ir até uma agência do INSS.
Eu reescrevi assim, mas os profissionais de comunicação do INSS chegariam a outras soluções, talvez melhores.
Cada pessoa reescreverá o texto de um jeito pois a linguagem clara não é uma técnica de comunicação do tipo “tamanho único”. Ela reúne diretrizes que facilitam a leitura e o entendimento de textos, mas o trabalho vai além de uma lista de recomendações.
Pouca gente se dá conta que ler é algo que mobiliza vários recursos mentais. O processo se dá em diversas etapas. Todas elas podem interferir no entendimento.
Se você se interessa pela escrita com clareza, recomendo estudar os textos sobre compreensão leitora de Charles Perfetti. Ele tem um ótimo artigo chamado Reading Skills que explica bem as várias etapas do processo.
Recomendo também altas doses de empatia com quem vai ler e, especialmente, bom senso.