No calendário civil, o segundo semestre chegou já faz um tempinho.
No calendário da pós-graduação universitária (onde agora passo parte do tempo, no mestrado em Design na PUC-Rio), ainda faltam uns dias.
Antes que as aulas voltem, aproveito para reunir os principais fatos da minha trajetória na Linguagem Simples de janeiro até aqui.
Uma cena portuguesa com certeza
Em janeiro, tive a chance de encontrar alguns expoentes da cena da Linguagem Clara em Portugal.
Passei uns dias de férias por lá e aproveitei para procurá-los. Foram conversas agradáveis, repletas de informação e trocas de experiência.
O primeiro encontro foi com a grega Maria Vlachou. Ela é diretora executiva da Acesso Cultura e uma das organizadoras do Prêmio Linguagem Clara. Ainda não nos conhecíamos e almoçamos juntas.
Maria mora em Lisboa há 25 anos. Ela atua no setor da acessibilidade cultural desde 2005. Naquele ano, um grupo de profissionais da cultura começou a se reunir com o objetivo de fortalecer a acessibilidade a exposições, museus e peças de teatro em Portugal.
“No ano seguinte, o tema de nossa primeira conferência foi a linguagem”, conta. “Desde então, estamos sempre trabalhando para melhorar a compreensibilidade de textos no circuito cultural português”.
Anos depois, aquele mesmo grupo de profissionais fundou a Acesso Cultura. É uma associação com 131 pessoas e 22 instituições atuantes na cena cultural portuguesa. A Acesso Cultura organiza um prêmio anual de Linguagem Clara desde 2017.
Perguntei à Maria se ela acha que um dia vamos conseguir mudar a realidade dos textos desnecessariamente confusos que nos circundam.
Adorei a resposta dela:
Maria Vlachou, Acesso Cultura
Dica anotada.
Diário da República Eletrônico: resumos “inegociáveis”
Também tive a honra e a alegria de encontrar em Lisboa com a equipe responsável pelos resumos em linguagem clara no Diário da República Eletrônico (DRE) – o equivalente português ao nosso Diário Oficial.
Fui recebida por Carlos Ribeiro, então diretor da Imprensa Nacional – ele se aposentaria pouco depois – e três dos advogados que redigem os resumos. Em Portugal, usa-se o termo jurista.
Os juristas Andrea Chrystêllo, Bruno Maia e Ana Patricia Fonseca foram tão generosos quanto o seu chefe ao trazerem para o encontro informações que sabiam ser relevantes para os meus estudos.
Carlos contou que os resumos em linguagem clara começaram em 2011, no governo do Partido Socialista. A agência portuguesa Claro preparava os resumos e entregava-os prontos para publicação no DRE.
O projeto foi suspenso entre 2013 e 2017, enquanto o Partido Social Democrata esteve no poder. Bastou os socialistas voltarem e também voltaram os resumos em Linguagem Clara no DRE. A Claro treinou a equipe que vem redigindo os textos desde então.
Perguntei a Carlos como eles negociam a reescrita dos termos com os políticos que conceberam as leis. Ele respondeu de bate-pronto:
Carlos Ribeiro, Diário da República Eletrônico
Adorei o tom incisivo. Anotei a dica.
Até a data de nosso encontro, já haviam sido publicados 466 resumos de decretos aprovados por conselhos de ministros. Os textos em linguagem clara são informativos, sem valor legal.
Agradeço imensamente à equipe da Imprensa Nacional pelos importantes materiais de trabalho que compartilharam comigo.
Por fim, mas não por último: café com Claro
Tentei marcar um café para rever Sandra Fisher-Martins, fundadora da agência Claro, mas ela está morando na Inglaterra. Combinei então de encontrar com Miguel Martinho, CEO da agência.
Tomamos café em uma tradicional padaria do bairro Príncipe Real.
Contei para Miguel um pouco do que venho construindo no Brasil desde 2017, quando visitei o escritório da Claro em Lisboa. Ele fez comentários e deu sugestões. Trocamos impressões sobre os desafios da linguagem clara em nossos países.
Foi um encontro simpático ao cair da tarde.
A primeira oficina a gente nunca esquece
Talvez você tenha lido as publicações no blog (aqui e também aqui), mas não custa relembrar. A nossa primeira oficina aberta de Linguagem Clara ocorreu em 23 de fevereiro, sábado, no Rio de Janeiro.
As oito alunas inscritas curtiram a experiência. Criamos um grupo de Whatsapp e temos mantido a troca de informações sobre textos fáceis ou difíceis de entender. Esse é mesmo um aprendizado para a vida.
O dia de atividades da oficina foi organizado com a engenheira Lia Nóbrega, colega de LincLab.
Voo acadêmico: de pesado, só o conhecimento
Em março, começaram as aulas do mestrado em Design na PUC-Rio.
Tenho um carinho especial pela PUC desde os tempos em que fiz a segunda graduação em Teologia (e não concluí, infelizmente).
Em 2016, foi lá que comecei a construir a nova trajetória profissional na Linguagem Simples, cursando a especialização em Cultura do Consumo.
Adoro o lema do brasão da PUC-Rio: Alis Grave Nil (“Com asas, nada é pesado”).
Pesados são os livros que carrego comigo dentro da bolsa nos ônibus de ida e volta.
O conhecimento também ficou mais parrudo. Mas aqui lógica é parecida com um Kindle: mesmo entulhado de arquivos, o conhecimento pesa igual. Deve ter asas.
Cursei duas disciplinas de metodologia e uma disciplina de design de serviços com foco na longevidade.
Tive reuniões semanais junto com os colegas também orientados pela professora Claudia Mont’Alvão. E reuniões quinzenais da linha de pesquisa Ergonomia, Usabilidade e Interação Humano-Computador.
Claudia sugeriu propormos um artigo para o Congresso Internacional de Design da Informação (CIDI 21019). A coorientadora Erica dos Santos Rodrigues deu força. Definimos o escopo, eu escrevi, elas revisaram. Também deu pitacos o professor Antonio Engelke, orientador da especialização. O artigo foi aceito.
O título é “Compreensibilidade em textos de e-gov: análise exploratória da escrita do INSS”. O congresso será em novembro, em Belo Horizonte.
Também propus um artigo para a X Jornada de Pesquisa e Extensão da Câmara dos Deputados sobre uso de linguagem simples no legislativo sulamericano. O artigo foi aprovado. Vou apresentá-lo em setembro, em Brasília.
Para a disciplina de Longevidade, escrevi o artigo “Envelhecimento, Ageing in Place e o Direito de Entender: Reflexões sobre a aprendizagem sênior em prol da Linguagem Simples”. A professora Vera Damázio gostou do artigo e ficou animada para tentarmos publicar.
Mais uma vez estou vendo que as asas da PUC-Rio podem levar longe mesmo.
Mudança de nome: sai clara, entra simples
O mês de abril trouxe uma grande transformação por aqui. Após dois anos usando o nome Com Clareza, mudamos para Comunica Simples.
E também passamos a usar preferencialmente a expressão “linguagem simples” como tradução de plain language.
Foi preciso alterar logomarca, endereço do site, nomes de perfil em redes sociais, cartão de visitas e material promocional.
O troca troca foi agitado, mas deu tudo certo! Além de recebermos elogios pelo novo nome, ficou mais fácil explicar o serviço que prestamos.
Capacitação corporativa: aula em Brasília
Em maio, dei a nossa primeira capacitação corporativa em Linguagem Simples.
Foi em Brasília, na Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel). O treinamento despertou o interesse de 61 pessoas, mas havia apenas 30 vagas.
A turma era formada por profissionais de diferentes setores da Aneel. Todos estavam focados e conscientes do grande desafio que é escrever de forma simples e direta, especialmente textos que regulamentam o setor e orientam consumidores.
Dias depois, o pessoal do RH da Aneel encaminhou as avaliações dos participantes. Os comentários foram super positivos. Só teve gente reclamando porque queria mais aulas. Concordo, um dia só é pouco.
Agradeço muito à Aneel pela confiança e pela receptividade ao trabalho.
Palestra sobre Linguagem Simples no Legislativo
Em junho, fui convidada pela Geiza Rocha, do Fórum Permanente de Desenvolvimento Estratégico do Estado do Rio, para falar sobre Linguagem Simples na série de encontros “Fórum Capacita”.
O Fórum é uma iniciativa da Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro para aproximar o Poder Legislativo de diversos setores da sociedade.
A palestra sobre Linguagem Simples foi em 6 de junho, no auditório da Escola do Legislativo (Elerj).
Foi muito instigante conversar sobre a importância de elaborar textos fáceis de ler com uma plateia engajada.
Veja um momento final de interação com a plateia. Uma participante comenta que a palestra “provoca a transformação” e sintetiza o que foi apresentado. Eu respondo.
Espero que a ideia de estimular o uso da linguagem simples na comunicação pública siga adiante no Fórum e na Alerj. Contem comigo no que for necessário.
Curso aberto presencial em novo formato
Em junho, foi a vez de oferecer mais um curso aberto no Rio.
A experiência da oficina inaugural em fevereiro mostrou ser válido dividir o conteúdo do curso em três partes.
Oferecemos uma aula online e duas aulas presenciais no Nex Coworking. Tivemos sete inscritas.
A oficina foi organizada com o auxílio de Olga Ravelles e Natassja Oliveira Menezes.
Curso introdutório online na Udemy
Em julho, lançamos o curso online Introdução à Linguagem Simples, na plataforma Udemy. É um aulão de 1h30dividido em doze vídeos. R$ 99 reais.
O curso apresenta os fundamentos que norteiam a técnica de redação e o movimento social pela Linguagem Simples.
Os vídeos têm, no máximo, dez minutos de duração. Você pode ver no seu tempo, sem pressa. E pode assistir ao curso quantas vezes quiser.
Apresentamos o histórico do movimento internacional da Plain Language, mostramos por que é tão importante elaborar textos fáceis de de ler e ensinamos 3 princípios da Linguagem Simples. Nos cursos presenciais, ensinamos dez princípios.
O objetivo do curso online na Udemy é funcionar como porta de entrada para um tipo de conhecimento que requer treinamento intensivo.
Aprender a escrever em Linguagem Simples é como aprender um novo idioma: é preciso muitas horas de dedicação para dominar as regras e ganhar segurança.
Espero que os próximos meses tragam boas oportunidades de espalhar o aprendizado da Linguagem Simples e bons momentos para a pesquisa acadêmica.